sexta-feira, março 17, 2006

Good night, and good luck!

Gostei muito deste filme do George Clooney e fiquei a perceber porque não ganhou qualquer óscar, o que até o recomenda, mas não recomenda a academia.
O filme mexe no macartismo e na sombra que ele projectou de tal modo sobre a América e Hollywwood nos anos 50 e que ainda não se desvaneceu, nem lá perto. Raríssimos são os que ainda hoje são capazes de se assumirem abertamente como socialistas e quase inexistentes os que ousam confessar-se comunistas. E muito menos os que são capazes de premiar uma interpretação, NOTÁVEL, de David Strathairn. Sem menosprezo pelo excelente trabalho de Seymour Hoffman em Capote, a personagem de Edward Murrow diz muito mais, tanto pelo que diz como pelo que cala. E sempre com a câmara em cima, como todas as personagens. Porque é um filme sobre o medo. Sobre uma sociedade onde se instituiu o medo e se espalha pelo mundo, como o Polansky ia fazer com o vampirismo, em "Por favor não me morda o pescoço", quando no final foge com a namorada e o velhote, ambos já infectados. Note-se que a HUAC/ISC (Comissão de actividades anti-americanas) só foi (terá sido?) oficialmente extinta em 1975. As figuras públicas, nomeadamente actores, que se manifestam contra a guerra do Iraque
são vítimas, ainda hoje, dessa mentalidade: "Deploramos a idéia de que pessoas conhecidas publicamente devam sofrer profissionalmente por ter a coragem de expressar suas posições. Nem mesmo o menor indício de lista negra pode ser tolerado novamente neste país", disse o SAG (Screen Actors Guild) em comunicado à imprensa em 2003.
A referência ao The Front (poster) é porque se trata de um filme de Martin Ritt, onde Woody Allen faz de testa de ferro de argumentistas proscritos. Um filme onde um dos "perseguidos" é precisamente Zero Mostel, que também esteve na lista negra.
Mas não é o aspecto político que faz um filme bom ou mau. É a sobriedade e a segurança dos autores, o ritmo contido das interpretações a dar a desmesura do medo. Os diálogos são q.b. e a câmara denuncia nos gestos mais gestos mais banais, como acender inusitadamente o isqueiro a um colega e amigo, um sinal de medo, traição ou mentira. É um filme à pele, em espaço fechado, com as pessoas cara a cara, bem próximas da camâra. Murrow em momentos chave é filmado em contrapicado, talvez numa homenagem ao Wells do Mundo a seus pés, os pés que neste caso pareciam fugir debaixo dos pés de Murrow. A prova de que é um filme intenso, pelo menos eu senti-o assim, é que quando terminou pareceu-me tratar-se de uma curta metragem. E no entanto tinha passado hora e meia!
Estrela? **** (Pela coragem, pela qualidade e pelo argumento, pela diracção de actores, fotografia. Enfim, por tudo)

1 comentário:

Anónimo disse...

gostei também do boa noite e boa sorte.